Notícias

Distorção semântica punitivista não revoga competência da Justiça Eleitoral

quinta-feira, 28 de março de 2019
Postado por Gabriela Rollemberg Advocacia

Por Roberta Maia Gresta

A Justiça Eleitoral está na berlinda, de novo, com a decisão do Supremo Tribunal Federal de que é ela quem deve se pronunciar sobre a atração de competência para apurar, por conexão, os crimes que ganharam a alcunha de “crimes da lava-jato”.

A fúria, permeada pelo desconhecimento do que faz e como funciona a Justiça Eleitoral, exige o fim da instituição, que seria cara, inútil e destinada a “salvar corruptos”.

Os orgulhosos de sua própria ignorância não sofrem com dúvidas, mas para quem as tiver, ofereço uma reflexão.

A competência da Justiça Eleitoral para julgar crimes eleitorais e conexos a estes está prevista na lei. Desde a minha dissertação de mestrado, em 2014, defendo que a lei deve ser alterada.

A racionalidade da administração e do controle judicial das eleições, com seu enfoque nos direitos políticos e na legitimidade das eleições, é distinta da racionalidade do Direito Penal, famosa ultima ratio voltada pra inibir e punir onde tudo o mais falhar, e do processo penal, voltado (sim, apesar de nem sempre parecer) para a proteção do acusado. São duas lógicas distintas e me parece mais propício empregar todos os recursos e estratégias institucionais da Justiça Eleitoral no desempenho da primeira.

Meu argumento não passa por qualquer desprestígio aos quadros de juízes e servidores e aos órgãos investigativos que atuam na Especializada[1].

Ao contrário, destaco o que ainda passa distante da percepção da maioria das pessoas: o Direito Eleitoral é de altíssima especialização, tanto pela fundamentalidade dos direitos políticos quanto pela complexidade dos temas. E, sim, há um trabalho imenso a ser feito — um trabalho muitas vezes não percebido pela população que, digo e repito, acostumada a uma administração eleitoral de excelência em parâmetros mundiais, acaba “dando de barato” ter eleições seguras, com amplo acesso do cidadão às urnas, cadastro confiável e enfrentamento célere das questões judiciais.

Minha posição, então, é que a Justiça Eleitoral deve ficar com a competência da qual só ela cuida. E a competência penal, que outros órgãos também desempenham, não precisa ocupar a estrutura da Especializada.

Mas isso é uma sugestão para o debate em torno de uma alteração legislativa. A realidade normativa hoje é que a Justiça Eleitoral tem competência penal.

Lá atrás, forçaram os limites do artigo 350 do Código Eleitoral, crime de falsidade ideológica eleitoral, pra nele tentar fazer caber o caixa 2 de campanha. Esqueceram que a lei diz que, havendo crime conexo a crime eleitoral, a competência pra julgar todos eles passa a ser da Justiça Eleitoral.

Foi assim que colocaram, na marra, a formiguinha do artigo 350, um crime de menor gravidade, pra guinchar o elefante dos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e outros mais que constituem o foco da "lava jato".

A decisão do STF é, portanto, tecnicamente correta.

O problema está, então, na distorção semântica do artigo 350 do Código Eleitoral, que, aliás, serviu a uma interpretação mais radical da finalidade da "lava jato". Como se vê na mídia e mesmo em declarações de autoridades, a narrativa fortemente criminalizadora da política por vezes faz parecer que é melhor acabar com as eleições (aquelas que asseguram a renovação democrática dos detentores do poder) pois daí não se teria estímulo pra corromper.

A solução do impasse demanda, portanto, assumir o equívoco no alcance desmesurado do artigo 350 do Código Eleitoral. Aproveite-se pra sepultar propostas que querem ampliar a competência penal da Justiça Eleitoral, com a criação de um tipo específico para o caixa 2. Eventualmente, inverta-se a regra da atração de competência, ou se ponha fim à competência penal da Justiça Eleitoral.

Mas fujamos de sugestões falaciosas. Acabar com a Justiça Eleitoral não  assegurará a punição dos ímpios. Acabar com a democracia não vai salvar a virtude.


[1] Pontos, aliás, magistralmente refutados por Fernando Neisser, neste mesmo site: https://www.conjur.com.br/2019-mar-15/neisser-justica-eleitoral-competencia-julgar-lava-jato

Acesse o conteúdo completo em www.conjur.com.br

Categoria(s): 
,
Tag(s):
, , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , ,

#GRAinforma

Notícias relacionados

sex, 09 de maio de 2014

STJ escolhe novos membros para TSE e CJF

O ministro Herman Benjamin (foto) irá compor o Tribunal Superior Eleitoral como membro substituto, na vaga aberta com a renúncia do ministro […]
Ler mais...
qui, 16 de julho de 2015

Senadores aprovam projeto que autoriza partidos a se unirem em federação

Dois ou mais partidos poderão formar uma federação, que será registrada na Justiça Eleitoral, e poderá atuar como se fosse […]
Ler mais...
qui, 05 de setembro de 2013

TRE aprova contas de campanha de vereador por Cuiabá

As contas de campanha referentes às Eleições de 2012 do Vereador por Cuiabá Arilson da Silva foram aprovadas sem ressalvas […]
Ler mais...
seg, 10 de setembro de 2018

Juíza suspende propagandas após tradutor de libras ser acusado de inventar sinais

A juíza Maria do Céu Pitanga de Andrade, do Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo, concedeu liminar, nesta sexta-feira (7/9), para […]
Ler mais...
cross linkedin facebook pinterest youtube rss twitter instagram facebook-blank rss-blank linkedin-blank pinterest youtube twitter instagram