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Rito do TSE em Aije para analisar novos documentos deixa defesas sem recurso

terça-feira, 11 de julho de 2023
Postado por Gabriela Rollemberg Advocacia

Fonte: Conjur

Por Danilo Vital

O rito que o Tribunal Superior Eleitoral estabeleceu e adotou para tutelar a inclusão de novos documentos após o prazo para ajuizamento das ações de investigação judicial eleitoral (Aijes) sob sua competência criou um ponto cego processual para as defesas dos investigados.

A decisão tomada por ele, por ser interlocutória, é irrecorrível. É o que indicam o artigo 48 da Resolução 23.608/2019 e o artigo 19 da Resolução 23.478/2016, que o TSE editou para regulamentar procedimentos especiais como o da Aije e estabelecer diretrizes para a aplicação do Código de Processo Civil de 2015 no âmbito da Justiça Eleitoral, respectivamente.

Se o relator da matéria decidir levar esse pronunciamento ao referendo do Plenário do tribunal, a questão se tornará também preclusa — no caso, pela regra do artigo 505 do CPC, que impede os juízes de decidir novamente as questões já decididas relativas à mesma lide.

'Minuta do golpe'
Foi o que aconteceu com a inclusão da chamada "minuta do golpe" na Aije em que Jair Bolsonaro foi condenado à pena de inelegibilidade por abuso do poder político e uso indevido dos meios de comunicação na reunião que fez com embaixadores estrangeiros, em julho de 2022.

ação foi ajuizada pelo PDT em agosto do ano passado. Em janeiro deste ano, com a demanda já estável, o partido pediu ao TSE para incluir na ação a minuta encontrada na casa do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Anderson Torres, em decorrência das investigações sobre os atos golpistas de 8 de janeiro em Brasília.

Para o PDT, a minuta tinha relação com a causa de pedir da ação, pois reforçava a intenção que levou Bolsonaro a cometer o abuso de poder político: desacreditar a Justiça Eleitoral e o processo de votação brasileiro. O relator aceitou a solicitação e, após um pedido de reconsideração feito pela defesa de Bolsonaro, decidiu levar o caso a referendo do Plenário.

Em fevereiro, por unanimidade de votos, o TSE referendou a decisão, fixando critérios para a inclusão desses novos documentos em todas as Aijes das eleições presidenciais de 2022 — só Bolsonaro responde por mais 15 delas.

Apesar de, em sua decisão interlocutória, o relator ter previsto manifestação das defesas por causa do referendo, a sustentação oral foi negada pelo presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, na data do julgamento, por falta de previsão regimental.

Sem recurso e sem manifestação, a defesa apresentou sua oposição à juntada da "minuta do golpe" nas alegações finais da ação. Por maioria de votos, o TSE decidiu não conhecer da preliminar por considerar o tema precluso.

Pedidos de reconsideração
Esse rito do TSE, de fato, não surpreendeu as partes da Aije, pois foi adotado desde o princípio pelo ministro Benedito Gonçalves: resolver antecipadamente preliminares que poderiam levar à extinção do processo sem resolução de mérito e questões prejudiciais que tinham impacto na definição do curso da instrução.

Como não caberia recurso contra essas decisões interlocutórias, e para prestigiar ao máximo o contraditório e o dever de fundamentação, o corregedor-geral da Justiça Eleitoral recebeu as tentativas de recurso da defesa de Bolsonaro como pedidos de reconsideração, afastando-os monocraticamente.

Quando o tema dos documentos novos chegou ao julgamento do mérito da ação, o relator observou que "os investigados fizeram bom e oportuno uso dessa dinâmica, que permitiu, inclusive, o exame imediato de pedido de reconsideração pela corte". Assim, ele disse que, "se já houve decisão colegiada a respeito de uma questão processual, opera-se a preclusão pro judicato".

Preclusão do quê?
Abriu a divergência o ministro Raul Araújo, por considerar que o elemento que caracteriza a preclusão é a perda da possibilidade de praticar um ato processual. Se não há ato processual a ser praticado, já que as decisões interlocutórias são irrecorríveis, não há como decretar a preclusão.

A Resolução 23.608/2019, no mesmo artigo 48, traz a solução para esse problema ao prever que as questões que são alvos de decisões interlocutórias deverão ser novamente analisadas por ocasião do julgamento, caso assim o requeiram as partes em suas alegações finais.

Para o ministro Araújo, o fato de o relator ter levado a questão a Plenário também não causa preclusão, pois as normas do TSE definem as alegações finais como o momento apropriado para opor teses diferentes sobre esses temas. Negar esse direito é violar o devido processo legal e ao contraditório, segundo ele.

No voto do ministro, essa posição fez toda a diferença. Foi o que permitiu reanalisar a inclusão da "minuta do golpe" na ação. Na primeira oportunidade, ele concordou por entender que o relator poderia analisar a pertinência do documento com o resto do acervo probatório.

Já no julgamento da ação, o magistrado entendeu que não há qualquer elemento informativo capaz de sustentar, para além de ilações, a existência de relação entre a reunião e a minuta, bem como de outros documentos. Assim, restringiu o campo de análise dos atos praticados por Bolsonaro.

Isso fez o episódio perder um dos requisitos para caracterizar o abuso do poder político: a gravidade acentuada. A conclusão final de Araújo, que foi vencida, foi de que os atos do ex-presidente não tiveram força para desequilibrar a igualdade entre candidatos e o livre exercício do voto.

Impacto reduzido?
O voto do ministro Floriano de Azevedo Marques, apesar de acompanhar o relator nas preliminares, analisou o tema da ampliação objetiva da demanda e afastou as alegações da defesa porque, conforme o artigo 23 da LC 64/1990, o tribunal deve formar sua convicção inclusive por fatos que não foram indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral.

Ainda assim, ele pontuou que os fatos posteriores à estabilização da demanda não são determinantes. "São, ao meu sentir, graves e muito relevantes para as investigações em curso nos inquéritos criminais e nos processos que têm por objeto investigar crimes contra o Estado de Direito e delitos associados. Para a presente análise da Justiça Eleitoral, contudo, os tenho como periféricos, prescindíveis para fundamentar decisão."

A ministra Cármen Lúcia e os ministros André Ramos Tavares e Alexandre de Moraes, que formaram a maioria, proferiram votos sem dar protagonismo à inclusão dos novos documentos, destacando a reunião em si a partir do precedente firmado pelo TSE no "caso Francischini".

Já o ministro Kassio Nunes Marques, que divergiu da maioria e votou pela improcedência da ação, afirmou que toda e qualquer preliminar deve poder ser conhecida no momento do julgamento da Aije. "É o que garante aos investigados a ampla defesa e o contraditório, e aos novos membros do tribunal, o exercício de sua função jurisdicional."

À revista eletrônica Consultor Jurídico, a defesa de Bolsonaro, feita pelo advogado Tarcísio de Vieira Carvalho, apontou que não há qualquer espécie de preclusão — temporal, lógica ou consumativa. E registrou que, diante da relevância do tema durante a instrução do processo, fez pedidos de reconsideração exatamente para evitar prejuízos à ampla defesa e ao devido processo legal.

"Com efeito, a rejeição do pedido de reconsideração foi levada a referendo. E o referendo, na condição de decisão colegiada, é perfeitamente recorrível, razão pela qual consta dos autos um recurso extraordinário ainda pendente de análise", disse Carvalho. O caso será analisado, portanto, pelo Supremo Tribunal Federal.

"Ainda que assim não fosse, a matéria foi suscitada em sede de alegações finais, para ser tratada no julgamento do mérito. Isto é, a defesa suscitou o que considera uma violação processual em todos os momentos oportunos, o que, a nosso juízo, a torna madura para ser incorporada à discussão constitucional que se seguirá", defendeu a advogada Marina Morais, que também integra a defesa de Bolsonaro.

Aije 0600814-85.2022.6.00.0000

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