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O governador que foi cassado três vezes e continua no cargo

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2024
Postado por Gabriela Rollemberg Advocacia

O Tribunal Regional Eleitoral de Roraima cassou na segunda-feira (22) o mandato do governador Antonio Denarium (PP) por abuso de poder político e econômico e aplicou ao político a pena de oito anos de inelegibilidade.

Essa foi a terceira decisão do órgão pela cassação de Denarium. Como ainda cabe recurso, assim como nas outras vezes, ele permanece no cargo. A ação, movida pela coligação derrotada pelo governador nas eleições de 2022, o acusa de usar programas sociais do estado com finalidade eleitoreira.

Neste texto, o Nexo explica quem é Antonio Denarium, detalha a decisão judicial que cassou seu mandato e mostra quais razões o mantêm no governo de Roraima.

Quem é Antonio Denarium?

Empresário rural e do mercado imobiliário, Denarium concorreu a um cargo eletivo pela primeira vez em 2010, quando foi o suplente na chapa para o Senado de Marluce Pinto (PSDB), que não se elegeu. O empresário era filiado ao
PPS, atual Cidadania, partido no qual permaneceu até 2018, quando migrou para o extinto PSL (a sigla se fundiu ao DEM para formar o União Brasil) e lançou sua candidatura ao governo do estado.

Roraima enfrentava crises policial, penitenciária e migratória, a última em decorrência da chegada em massa de venezuelanos que atravessaram a fronteira.
Alinhado ao então candidato à Presidência Jair Bolsonaro, de quem era colega de partido, e com um discurso fortemente contrário à imigração, Denarium foi mais um novato na política a derrotar figuras tradicionais no pleito - a então governadora Suely Campos (PP). ainda no primeiro turno, e Anchieta Júnior (PSDB), que havia comandado o estado por oito anos, no segundo.

Um mês antes de se mudar para o Palácio
Senador Hélio Campos, o governador eleito foi o interventor federal em Roraima, após um decreto do ex-presidente Michel Temer afastar Suely Campos diante do cenário de crises no estado.

No mandato, Denarium foi um dos chefes de Executivo estadual a adotar menos medidas restritivas na pandemia da covid-19, em consonância com Bolsonaro. Em março de 2020, foi condecorado pelo então presidente com a Ordem do Mérito Militar.

Ele repetiu o apoio a Bolsonaro em 2022, quando, apesar de derrotado nacionalmente, o ex-presidente manteve grande popularidade em Roraima. Na corrida para o governo do estado, Denarium foi reeleito ainda em primeiro turno pelo PP.

O que fez o TRE cassar seu mandato?

A ação que levou à cassação foi movida pela coligação que perdeu para Antonio Denarium nas eleições de 2022, encabecada por Teresa Curito ov-cennco da Romara Trad /MDR).

A chapa acusou o governador e seu vice, Edilson Damião (Republicanos), de abuso de poder político e econômico no uso de dois programas sociais para distribuir quase R$ 70 milhões à população no ano da eleição e por transferir irregularmente recursos para municípios.

Um dos programas é o Cesta da Família. Em março de 2022, a sete meses das eleições, um decreto estadual aumentou o alcance de um programa chamado Renda Cidadã, aprovado em abril de 2020, de 10 mil para cerca de 50 mil beneficiários (que recebiam R$ 200), retirou o condicionamento ao cumprimento de contrapartidas sociais e mudou seu nome para Cesta da Família. A imprensa local noticiou a iniciativa do governo.

A desembargadora Tânia Vasconcelos, relatora do caso no TRE, argumentou que a legislação eleitoral restringe a distribuição gratuita de benefícios pela administração pública em anos eleitorais, salvo nos casos de continuidade de um programa existente ou em calamidades públicas. Segundo a decisão, as mudanças configuraram a criação de uma nova ação assistencial, sem as circunstâncias que públicas. Segundo a decisão, as mudanças configuraram a criação de uma nova ação assistencial, sem as circunstâncias que permitiriam isso em um ano eleitoral.

A outra iniciativa em questão é o Morar
Melhor, um programa habitacional criado em outubro de 2021. Em março de 2022, o site
Panorâmica News, de Boa Vista, noticiou que o governo concluiu a etapa inaugural de entregas do Morar Melhor, que constou pela primeira vez na Lei Orçamentária Anual de Roraima naquele ano.

Além da ampliação de beneficiários inicialmente previstos em ano eleitoral, o TRE ouviu testemunhas segundo as quais servidores do governo disseram que as entregas de suas casas em anos seguintes dependiam da reeleição de Denarium.

A decisão judicial também apontou transferência irregular de recursos do estado para municípios cujos prefeitos se aliaram a Denarium.

A defesa da chapa que governa Roraima disse que a pandemia da covid-19 e a "forte imigração de venezuelanos e haitianos" aumentaram as demandas por assistência social, o que exigiu a readequação dos investimentos públicos. Para a relatora, as ações permitiram ao governador alavancar sua popularidade no ano em que disputava a reeleição, visto que o fluxo migratório no estado era verificado em anos anteriores e, em 2022, as medidas de prevenção à pandemia estavam sendo revogadas.

5 a 2
foi o placar do julgamento no TRE de Roraima pela cassação do mandato da chapa que governa o estado

O TRE de Roraima decidiu que Antonio Denarium e Edilson Damião devem perder o mandato por abuso de poder político e econômico. O governador recebeu ainda a pena de inelegibilidade por oito anos a partir do pleito em que foi reeleito - como o atual vice-governador não ocupava o cargo na época dos atos, ele não se enquadrou na punição.

Em agosto e novembro de 2023, Denarium havia sido condenado pelo uso irregular dos mesmos programas sociais. Nas duas vezes, ele não foi afastado do cargo - situação que se mantém na nova decisão, Em nota no Nexo, a assessoria do governador disse que ele respeita a decisão judicial e reitera a confiança na Justiça e nas instituições democráticas, mas acredita que ela será revertida em instância ruperior.

O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) ainda vai analisar a decisão do TRE de Roraima para determinar se confirma ou não a cassação. A partir da decisão da instância superior, o governador pode ser afastado.

A advogada Gabriela Rollemberg, professora do Instituto Brasiliense de Direito Público, disse ao Nexo que "a decisão proferida pelo TRE não possui caráter definitivo, uma vez que cabe recurso com efeito suspensivo no TSE". Os efeitos da decisão sobre os acusados, disse Rollemberg, são produzidos apenas após essa análise, que também pode determinar a convocação de novas eleições.

Não há um prazo para que ela aconteça. Em janeiro de 2016, o TRE do Amazonas cassou os mandatos do governador José Melo (Pros) e do vice-governador José Henrique de Oliveira (do então PR, atual PL) por participação em um esquema de compra de votos nas eleições de 2014, quando foram eleitos. A decisão que afastou a chapa foi tomada pelo TSE mais de um ano depois, em maio de 2017. O estado elegeu um novo governador em agosto de 2017.

Além da definição jurídica, o processo de afastamento de um representante eleito passa pelos apoios político e popular - ou a falta deles. O cientista Dolítico Roberto Ramos. A governadora anterior [Suely Campos] não concluiu seu mandato, e enfrentou fortes crises em sua gestão, algo que foi contornado por Denarium. Além disso, a esquerda, que naturalmente estaria na oposição ao governador, é pouco mobilizada no estado". afirmou Ramos.

O professor disse que a tentativa de cassação dá continuidade a um "processo histórico" do estado nos últimos anos. Em novembro de 2004, o governador Flamarion Portela (à época no PT), que havia sido reeleito em 2002, teve o mandato cassado em definitivo. O adversário Ottomar Pinto (então no PTB), segundo colocado no pleito, assumiu o cargo.

Desde então, segundo Roberto Ramos, há tentativas constantes de judicializar os resultados eleitorais no estado. "Essas acusações quase sempre envolvem o uso eleitoral de programas sociais. É importante entender que Roraima tem o menor PIB do país e um baixo nível de industrialização, o que gera uma forte dependência popular de assistencialismo. A discussão entre o que é um programa necessário e o que é um ato de candidatura é constante", disse ao Nexo.

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