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A obrigatoriedade do pagamento do contribuição sindical definida por assembleia

sexta-feira, 01 de junho de 2018
Postado por Gabriela Rollemberg Advocacia

Por Carolina Louzada Petrarca, Carla Louzada Marques Carmo e João Paulo Gregório

                Em pouco tempo de vigência no ordenamento pátrio, a Lei nº 13.467/2017, que instituiu a Reforma Trabalhista, é responsável por um cenário de forte instabilidade jurídica, decorrente das diversificadas interpretações a ela inerentes. Um dos alvos de críticas pontuais se trata da contribuição sindical que, após a modificação legislativa, deixou de ser obrigatória.

 

              À luz do texto antigo da Consolidação das Leis Trabalhistas, especificamente na disposição contida no artigo 578, o desconto da contribuição sindical é o montante pago aos sindicatos correspondentes ao valor de um dia de trabalho por ano de cada empregado.

              O objetivo da cobrança era o custeio das atividades sindicais e os valores destinados à "Conta Especial Emprego e Salário", a qual integra os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador. Essa contribuição era a única que o trabalhador não sindicalizado era obrigado a pagar.

              Segundo os ensinamentos de Mauricio Godinho Delgado[1], a contribuição sindical se refere à “receita recolhida uma única vez, anualmente, em favor do sistema sindical, nos meses e montantes fixados na CLT. (...) Derivada de lei e incidindo também sobre os trabalhadores não sindicalizados, a receita tem indisfarçável matiz parafiscal”.

              Ocorre que, com a instituição da Lei nº 13.467/2017, a contribuição sindical sofreu significantes alterações que refletem, sobremaneira, no sistema sindical. O referido diploma legal trouxe mudança bastante expressiva sobre a temática contribuição sindical no sentido de se determinar que para a validade do seu recolhimento mediante desconto na folha de pagamento do trabalhador, se faz imprescindível a autorização prévia e expressa do empregado.

              A não obrigatoriedade da contribuição sindical se encontra positivada nos artigos 578, 579 e 582 da Consolidação das Leis Trabalhistas que assim discorrem:

Art. 578.  As contribuições devidas aos sindicatos pelos participantes das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas pelas referidas entidades serão, sob a denominação de contribuição sindical, pagas, recolhidas e aplicadas na forma estabelecida neste Capítulo, desde que prévia e expressamente autorizadas. (g.n).

Art. 579.  O desconto da contribuição sindical está condicionado à autorização prévia e expressa dos que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, inexistindo este, na conformidade do disposto no art. 591 desta Consolidação. (g.n).

Art. 582.  Os empregadores são obrigados a descontar da folha de pagamento de seus empregados relativa ao mês de março de cada ano a contribuição sindical dos empregados que autorizaram prévia e expressamente o seu recolhimento aos respectivos sindicatos. (g.n).

              Nesse sentido, a nova legislação trabalhista afasta o caráter obrigatório da contribuição sindical, ao asseverar que o respectivo desconto está condicionado à autorização prévia e expressa dos trabalhadores que participarem de determinada categoria.

              No entanto, com a intenção de criar estratégias de forma a resgatar a pagamento da contribuição sindical, e com o intuito de evitar a perda da receita obtida através da contribuição sindical inúmeros órgãos de classes, em especial os que representam os trabalhadores, convocam assembleia geral com a finalidade de deliberar sobre a referida receita. Segundo o entendimento defendido pelo sindicado, a contribuição sindical, mesmo com a alteração legislativa, passa a ser obrigatória se for de deliberada em assembleia sindical.

              Com base nas alterações oriundas da Lei nº 13.467/2017, é possível afirmar que a deliberação sobre a contribuição sindical por Assembleia Sindical não se reveste de plausibilidade jurídica para obrigar o empregado que não autorizou o desconto de forma individual e expressa.

              A expressão “devidamente autorizados” deve ser interpretada como manifestação expressa dos empregados envolvidos, até porque, somente tal entendimento pode estar em consonância com os demais dispositivos alterados (arts. 578, 579, 582 e 583 da “nova CLT”). Não cabe autorização tácita, sob pena de se jogar por terra a mudança ocorrida que passa a exigir manifestação consciente e voluntária para a cobrança das contribuições. [2]

              Além disso, conferir poderes à Assembleia Sindical para decidir sobre a possibilidade de descontar a contribuição sindical, inclusive, sem a participação de todos os empregados, mesmo com a divulgação plena do dia e hora do referido ato sindical, incorre em violação aos artigos 578, 579 e 582 da Consolidação das Leis Trabalhistas.

              Em análise dos dispositivos em comento, infere-se que o trabalhador deverá autorizar o desconto da contribuição sindical, não podendo mais aplicar a regra de imposição do seu pagamento, nos termos da antiga redação do artigo 579 da CLT. Entendimento contrário incorreria em patente violação ao Princípio da Legalidade, previsto no inciso II, artigo 5º da Constituição Federal de 1988, que dispõe que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

              A inteligência inserta nos artigos 578, 579 e 582 da Consolidação das Leis Trabalhistas mitiga a soberania da Assembleia Sindical, ao conferir caráter personalíssimo à decisão de descontar a contribuição sindical dos trabalhadores, sindicalizados ou não.

              Antes da reforma trabalhista, o Supremo Tribunal Federal já havia se manifestado no sentido de que a contribuição assistencial definida em Assembleia não tinham caráter compulsório, não se aplicando aos empregados não sindicalizados. Vejamos:

EMENTA: CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO: JULGAMENTO PELO RELATOR. CPC, art. 557, § 1º-A. POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO IMEDIATO DE OUTRAS CAUSAS, EM QUE VERSADO O MESMO TEMA, PELOS RELATORES OU PELAS TURMAS. SINDICATO. CONTRIBUIÇÃO INSTITUÍDA PELA ASSEMBLÉIA GERAL: CARÁTER NÃO TRIBUTÁRIO. NÃO COMPULSORIEDADE. EMPREGADOS NÃO SINDICALIZADOS: IMPOSSIBILIDADE DO DESCONTO. C.F., art. 8º, IV. I. - Legitimidade constitucional da atribuição conferida ao Relator para arquivar, negar seguimento a pedido ou recurso e a dar provimento a este - RI/STF, art. 21, § 1º; Lei 8.038/90, art. 38; CPC, art. 557, caput, e § 1º-A - desde que, mediante recurso, possam as decisões ser submetidas ao controle do Colegiado. Precedentes do STF. II. - A contribuição confederativa, instituída pela Assembléia Geral - C.F., art. 8º, IV - distingue-se da contribuição sindical, instituída por lei, com caráter tributário - C.F., art. 149 - assim compulsória. A primeira é compulsória apenas para os filiados do sindicato. III. - Agravo não provido. (RE 302513 AgR, Relator(a):  Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 24/09/2002, DJ 31-10-2002 PP-00039 EMENT VOL-02089-03 PP-00404).

CONSTITUCIONAL. SINDICATO. CONTRIBUIÇÃO INSTITUÍDA PELA ASSEMBLÉIA GERAL: CARÁTER NÃO TRIBUTÁRIO. NÃO COMPULSORIEDADE. EMPREGADOS NÃO SINDICALIZADOS: IMPOSSIBILIDADE DO DESCONTO. C.F., art. 8º, IV. I. - A contribuição confederativa, instituída pela assembléia geral - C.F., art. 8º, IV - distingue-se da contribuição sindical, instituída por lei, com caráter tributário - C.F., art. 149 - assim compulsória. A primeira é compulsória apenas para os filiados do sindicato. II. - R.E. não conhecido. (RE 177529, Relator(a):  Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 13/05/1997, DJ 03-10-1997 PP-49278 EMENT VOL-01885-08 PP-00617)

              Ora, antes da reforma, a própria Corte Suprema entendeu que as contribuições definidas em assembleia não poderiam ser impostas ao empregado não sindicalizado. Após o entendimento insculpido na Lei nº 13.467/2013, além da contribuição sindical ser equiparada à contribuição assistencial (não obrigatória), a mitigação da soberania da Assembleia Sindical se convalida pelos mesmos fundamentos.

              Os Sindicatos tem defendido a possibilidade da cobrança da contribuição sindical por meio de Assembleia, fundamentando-se nos seguintes argumentos: a) que o conceito de categoria, previsto na Constituição Federal não foi alterado pela Lei 13.467, e que, com isso, o sindicato continua representando todos os trabalhadores, sindicalizados ou não; b) que a parte da Lei nº 13.467/2017 que prevê sobre a não obrigatoriedade do imposto sindical é inconstitucional, tendo em vista que qualquer alteração sobre o assunto deveria ser regulamentada por lei complementar e não por lei ordinária.

              De fato, a Reforma Trabalhista não tem como finalidade alterar o conceito de categoria, no entanto, isto não é impedimento para que o próprio empregado se manifeste, expressamente, sobre a possibilidade de ter descontado em seu salário a contribuição sindical.

              Além disso, apenas o Supremo Tribunal Federal, no exercício do controle concentrado de constitucionalidade e consequente efeito erga omnes da respectiva manifestação, pode decidir sobre eventual inconstitucionalidade dos dispositivos que modificaram a forma de cobrança da contribuição sindical.

              Embora inúmeras ações declaratórias já estejam em trâmite na Corte Suprema com a finalidade de constatar a constitucionalidade da Lei nº 13.467/2017, até o presente momento, não há sequer liminar proferida nos autos das referidas ações, o que corrobora com a tese de que a lei que instituiu a reforma trabalhista possui eficácia plena.

              Cumpre salientar ainda que, da mesma forma que os empregados/trabalhadores poderão optar pelo recolhimento ou não da contribuição sindical a favor dos sindicatos da categoria respectiva, também os empregadores poderão optar pelo seu recolhimento ou não a favor da categoria econômica que os represente.

              Portanto, considerando que o desconto da contribuição sindical depende de prévia e expressa aceitação pelo empregado, de acordo com os artigos 578, 579 e 582 da Consolidação das Leis Trabalhistas; e considerando ainda que os referidos dispositivos legais mitigam a soberania da Assembleia Sindical, ao conferir caráter personalíssimo à decisão de descontar ou não a contribuição sindical dos trabalhadores, sindicalizados ou não, o desconto da contribuição sindical só é permitido na hipótese de autorização expressa e individual do empregado.

Carolina Louzada Petrarca é

Carla Louzada Marques Carmo é pós-graduada pela Escola da Magistratura; especialista em Direito Material e Processual do Trabalho pela ESA/DF; graduada em Direito pelo Centro Universitário de Brasília - UNICEUB; advogada e sócia do escritório de advocacia Petrarca Advogados.

João Paulo Gregório é especialista em Direito Material e Processual do Trabalho pela ESA/DF; graduada em Direito pelo Universidade Católica de Brasília - UCB; advogado e sócio do escritório de advocacia Petrarca Advogados.

[1] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho/Mauricio Godinho Delgado. – 13. ed. – São Paulo. 1408, LTr, 2014. ISBN 978-85-361-2817-7.

[2] Lei da Reforma Trabalhista: comentada artigo por artigo. Coordenador e coautor Deusmar José Rodrigues. – Leme (SP): JH Mizuno, 2017, p. 219.

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